Márcio Cozatti - Advocacia

sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

LEI MARIA DA PENHA E SUA UTILIZAÇÃO (Ana Paula Janzon Moreno)


            Esse ano a Lei Maria da Penha completará 14 anos. O seu surgimento ocorreu como consequência de uma condenação da Corte Interamericana de Direitos Humanos porque o Brasil foi considerado omisso no caso da Maria da Penha.
            Entendendo o caso da Maria da Penha, esta sofreu duas tentativas de homicídio praticados pelo marido. Foram quase 20 anos de luta e seu caso foi levado à nível internacional uma vez que haviam se exauridas todas as possibilidades no Poder Judiciário brasileiro sem que houvessem medidas efetivas.
            O caso da Maria da Penha, que teve repercussão mundial, acarretou para o Brasil, em 2001, condenação pela OEA a definir uma legislação adequada para a violência contra a mulher, e ainda condenou o Brasil a pagar 20 (vinte) mil dólares à Maria da Penha.
            Em verdade, o cenário brasileiro no contexto mundial quando falamos em violência doméstica, é muito preocupante. Temos que o Brasil é o 5º colocado no mundo em termos de violência contra a mulher. É, portanto, um dos países mais violentos na atualidade.
            Antes de entrar em vigor a Lei Maria da Penha, para os casos de violência doméstica aplicava-se a Lei 9099/95, que significava, ao meu ver, uma banalização da violência contra a mulher. Isso porque, leva-se à questão para resolução consensual, tendo como punição ao agressor o pagamento de uma cesta básica – ficava barato bater em mulher.
            Pois bem, a Lei Maria da Penha ingressou no ordenamento jurídico buscando uma punição mais severa para os casos de violência doméstica, tendo retirado do âmbito da aplicação da Lei 9099/95 este tipo de crime, não cabendo mais o JECRIM.
            A Lei 11340/2006 configura, portanto, uma tentativa do Estado Brasileiro fazer valer o compromisso assumido em âmbito internacional de quebrar o circulo vicioso da violência doméstica.
               Esta lei foi criada justamente para lidar com os numerosos casos de violência que ocorrem no âmbito doméstico.
              Muito se discute se existe a aplicação da Lei Maria da Penha somente quando a vítima for uma mulher. Na verdade, a lei se aplica quando a violência ocorrer no âmbito familiar, abrangendo mulheres, travestis e transexuais, uma vez que mulher é identidade e independe do sexo atribuído no momento do nascimento.
            Por outro lado, o agressor não precisa ser necessariamente homem, podendo a lei ser aplicada quando a violência ocorre de uma mãe contra um filho.
            Temos, portanto, que a lei será aplicada sempre que a violência tenha ocorrido em um contexto de violência doméstica, familiar ou numa relação íntima de afeto.
          A relação íntima de afeto envolve os namorados, maridos, conviventes, ainda que o relacionamento já tenha finalizado. Observa-se ainda que a violência contra a mulher ocorrida num transporte público ou no ambiente de trabalho são tuteladas por outras leis que não a Lei Maria da Penha.
                Finalizando, ainda estamos caminhando na luta da violência doméstica, mas já realizamos grandes avanços. Sem sombras de dúvidas, o que temos que investir, muito mais que uma legislação severa, é na educação e conscientização!

Ana Paula Janzon Moreno é Advogada,
Sócia de Márcio Cozatti – Sociedade de Advogados,
Professora Universitária, Mestre em Direito.

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

O cumprimento de sentença e a possibilidade de parcelamento do débito (moratória legal)


Muito se diz a respeito da regra contida no art. 916 do CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC).

Não foi, em verdade, uma novidade. Havia, já no antigo CPC/73, art. 745-A, caput, com a redação dada pela lei 11.382/2006, tal permissão. A novidade trazida pelo CPC/2015 está no § 7º do art. 916, ao estabelecer que "o disposto neste artigo não se aplica ao cumprimento da sentença".

Explico.

A regra do art. 916 afirma que, “no prazo para embargos, reconhecendo o crédito do exequente e comprovando o depósito de trinta por cento do valor em execução, acrescido de custas e de honorários de advogado, o executado poderá requerer que lhe seja permitido pagar o restante em até 6 (seis) parcelas mensais, acrescidas de correção monetária e de juros de um por cento ao mês.

A interpretação literal do texto nos leva a crer que o parcelamento pode ser aplicado, tão somente, aos processos judiciais de execução, com base em título executivo extrajudicial.

O § 7º do referido artigo afirma que “o disposto neste artigo não se aplica ao cumprimento da sentença”. Fica, literalmente, excluída a possibilidade de se valer de tal benesse se o caso for de impugnação ao cumprimento de sentença.

Não há um argumento convincente e razoável para excluir a hipótese.

Alguns magistrados tem interpretado de forma diferente, inovadora e corajosa, admitindo a aplicação do instituto mesmo nos casos de cumprimento de sentença: Trata-se de pedido de parcelamento da dívida executada, com fundamento no art. 916, do Código de Processo Civil. O pedido veio devidamente acompanhado do depósito de 30% do valor da execução e não há notícia tenha deixado de pagar as parcelas subsequentes. Ante a concordância pelo exequente, DEFIRO o processamento do pagamento na forma parcelada. Fica suspensa a realização de atos executivos até ulterior decisão. Registre-se que o não pagamento de qualquer das prestações acarretará cumulativamente: I o vencimento das prestações subsequentes e o prosseguimento do processo, com o imediato reinício dos atos executivos; II a imposição ao executado de multa de dez por cento sobre o valor das prestações não pagas.” (Processo 0003379-65.2018.8.26.0309)

“A taxatividade do artigo 916, §7.º, do CPC/2015 apenas afasta a possibilidade de o magistrado singular impor tal modalidade de adimplemento (moratória legal). Contudo, não impede que o credor se utilize de tal faculdade, para obter a resolução do conflito (TJPR, Agravo de Instrumento n. 1580095-4, rel. Des. Dalla Vecchia, 11ª Câmara Cível, julgado em 08.02.2017)


Portanto, apesar da proibição do § 7º do art. 916 do CPC/2015, de o devedor se valer do parcelamento no cumprimento de sentença, tal possibilidade deve ser admitida se o exequente concordar com isso. Portanto, é razoável que o juiz deve ouça o exequente antes de simplesmente indeferir o pedido, por falta de amparo legal.